A evolução da Política Fiscal: tendências e desafios
Conferência “A Evolução da Política Fiscal: Tendências e Desafios” Numa parceria entre a APOTEC e o ISEG decorreu, no passado dia 24 de Setembro de 2008, no Auditório I deste Instituto de ensino superior a Conferência “A Evolução da Política Fiscal: Tendências e Desafios”, que esgotou a lotação da sala, que fora no passado uma antiga capela, agora brilhantemente transformada em auditório. Este evento que serviu para comemorar os 45 anos do Código da Contribuição Industrial, em vigor em 1963 e que com ele introduziu a figura do Técnico de Contas, contou com a presença de ilustres profissionais da área tributária, do ensino e da contabilidade, com especial destaque para o Director-Geral dos Impostos, José Azevedo Pereira. Honraram ainda esta conferência com a sua presença, várias associações privadas da área da fiscalidade de que destacamos a Associação Fiscal Portuguesa e a Associação Portuguesa de Peritos Contabilistas. Na Sessão de Abertura estiveram presentes: o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Carlos Lobo; o Presidente do Conselho Directivo do ISEG, António Mendonça; o Presidente da Direcção da APOTEC, Manuel Patuleia; o Coordenador do Mestrado de Fiscalidade do ISEG, Eduardo Couto e o Presidente do Conselho Científico da APOTEC, João Duque. Presidiu a esta sessão o Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, enaltecendo a oportunidade desta iniciativa, partindo de uma associação de profissionais que diariamente colaboram com a administração fiscal, sendo ainda de louvar a presença neste evento, dos senhores oradores, responsáveis pela política fiscal portuguesa dos últimos 20 anos, que seguramente pela experiência adquirida iriam enriquecer a temática em discussão. O Presidente do Conselho Directivo do ISEG realçou o interesse desta conferência, constituindo para o Instituto motivo de orgulho associar-se à APOTEC, que por força das relações protocolares existentes com a Associação bem como pela tradição curricular do ISEG, se conjugam numa oportunidade única para o debate da política fiscal. O Presidente da APOTEC deu as boas vindas aos participantes e referiu constituir para a Associação uma honra e um orgulho a comemoração dos 45 anos do Código da Contribuição Industrial e da profunda reforma fiscal então encetada, sem deixar de evocar a figura do Professor Doutor Camilo Cimourdain de Oliveira, único autor deste Código ainda presente entre nós. Lembrou ainda, que no âmbito da sua participação activa na defesa dos Técnicos de Contas, o recurso da APOTEC, no passado, ao Tribunal Constitucional, que veio a dar razão à Associação e a considerar inconstitucionais os artigos do Código da Contribuição Industrial e do Código do Imposto de Transacções alusivos à possibilidade de suspensão da actividade profissional sem culpa formada. Frisou que os propósitos da APOTEC se mantém inalteráveis e que a defesa, a formação e actualização de conhecimentos, a apresentação constante de ideias para discussão nas diversas frentes e entidades em que se faz representar, bem como a realização de novas parcerias com variadíssimas instituições, têm como objectivo continuar na senda da defesa dos interesses dos seus associados e finalizou afirmando não bastar para tal estar presente, mas sim marcar a diferença. O painel de Oradores desta conferência contou com os nomes já bem conhecidos dos associados da APOTEC, em particular, e dos profissionais da contabilidade, em geral, como António Carlos Santos, Vasco Valdez Matias, Rogério Manuel Fernandes Ferreira e João Amaral Tomás. A mesa dos Oradores, todos eles Ex-Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais, foi moderada por Eduardo Paz Ferreira, Advogado, Professor Catedrático e ex-Presidente da Associação Fiscal Portuguesa. O primeiro Orador da tarde, António Carlos Santos, chamou a atenção para o facto de não se poder fazer política fiscal sem se ter em conta a interdependência entre os Estados e instituições, como por exemplo a UE, a OCDE, a Organização Mundial de Comércio, etc.. Há muitos constrangimentos, e cada vez mais fortes, advindos da própria Integração Europeia ou do Pacto da Estabilidade. Segundo dados do Eurostat, nos últimos 10 anos assistimos a um aumento da carga fiscal global na UE a 27 Estados. Desta forma, a concorrência fiscal não provocou uma diminuição da tributação na UE, e temos hoje em dia uma estrutura fiscal que não tendeu “para o fundo”, pois a carga fiscal está distribuída de uma forma muito desigual. A pressão das taxas tributárias sobre o trabalho estabilizou, mas as taxas de tributação sobre o consumo e sobre o capital sofreram um aumento. Tendo em conta estas três áreas de impostos, a tributação fiscal, apesar de tudo, é mais favorável que há alguns anos. Verificou-se na tributação sobre o rendimento do trabalho uma tendência para uma diminuição dos escalões e quebra da produtividade. Assistiu-se ainda a uma contenção da descida da tributação sobre o capital e um maior peso na tributação do consumo em detrimento da tributação do rendimento. Concluiu, referindo que o grande desafio que se coloca, neste momento, é saber como poderemos responder a esta competitividade e concorrência fiscal. E como Portugal conseguirá dar resposta a este desafio de incerteza internacional, ultrapassando as dificuldades resultantes da necessidade de uma gestão integrada da “máquina fiscal” a que ainda hoje não se assiste, com uma maior simplificação e optimização dos recursos, a uma maior concentração física dos serviços da administração fiscal num mesmo espaço, para além de uma maior justiça tributária e ao mesmo tempo que permanece erradamente a tendência para um constante “zigzag” das políticas tributárias, sempre que se altera o Governo, sem esquecer a necessidade de continuar a cumprir o Pacto de Estabilidade e Crescimento. O segundo Orador da tarde, Vasco Valdez Matias, referiu que os paradigmas existentes até agora podem estar a alterar-se substancialmente, e pode estar a alterar-se a tendência no sentido de procurar um desagravamento fiscal. Por outro lado, assistimos durante largos anos a uma tendência económica para a liberalização, assente no modelo subjacente que ainda hoje vigora – o capitalismo –, procura diminuir a despesa e liderança do Estado e promove uma grande liberdade dos agentes económicos. Nos EUA, por ventura, este modelo poderá estar em causa e poderemos estar a assistir, nos últimos dias, a uma mudança de paradigma, trazendo uma maior intervenção do Estado na economia. O mesmo poderá vir a suceder na Europa. Esta mudança significativa poderá ter reflexos, nomeadamente, a nível da fiscalidade e a nível de alterações da carga fiscal. Salientou ainda, que se deverá evitar a intervenção do Estado, como tem vindo a ser prática corrente, através de alterações sucessivas da legislação, bem como através de uma isenção em larga escala da tributação sobre as mais-valias, devendo de deixar de haver privilégios de tributação das mais-valias bolsistas. Por outro lado, afirmou, que dever-se-ia caminhar no sentido do alargamento das bases tributáveis, em sede de IRS e proceder à diminuição das taxas, passando, eventualmente pela “limpeza” de muitos dos benefícios fiscais. Quanto ao IRC, defendeu uma maior tributação para as empresas que obtivessem uma remuneração mais elevada, ao invés de se dar continuidade à tendência generalizada que se tem assistido, no sentido da diminuição da tributação de todas as empresas. Defende assim, o desagravamento da tributação das PME’s para uma maior justiça tributária. Quanto à tributação do património, as linhas gerais têm sido mantidas, mas é necessário ter muita atenção e cautela com as avaliações, pois são uma área muito sensível. Há a crescente necessidade de haver uma actualização dos parâmetros constante de avaliação e uma consequente monitorização intensa, sob pena que se possam gerar injustiças para “baixo ou para cima”. Terminou salientando, que hoje, mais importante que criar mais legislação, é implementar uma melhoria da qualidade e simplificação dos textos legislativos, desenvolvendo esforços no sentido de estes serem produzidos por técnicos menos envolvidos com o “Fisco”, ou seja que deixem de ser elaborados por fiscalistas e passem a ser da responsabilidade de juristas. Por outro lado, existe uma maior necessidade de protecção dos contribuintes, uma vez que se passam anos sem que os tribunais tributários produzam uma única sentença, deixando os contribuintes completamente desprotegidos. Por último, deixou o repto, para que se forme um grupo de trabalho para estudar e perceber porque estes tribunais tributários não funcionam, deixando esse trabalho a cargo não de juristas, mas sim de gestores. O terceiro Orador da tarde, Rogério Manuel Fernandes Ferreira fez referência a algumas notas avulsas, que considerou importantes e oportunas. Começou por chamar a atenção da necessidade, no passado, da existência de reformas fiscais estruturais que dotassem o sistema fiscal de uma estrutura semelhante aos demais parceiros internacionais, mas que na verdade carece de simplificação e estabilidade normativa, permitindo um aumento significativo da competitividade nacional. Sugere a necessidade de melhorar a relação entre a administração fiscal e o contribuinte, fazendo a compatibilização da aplicação das regras do contencioso tributário, facilitando a vida ao contribuinte e à administração tributária. Neste âmbito, também a caducidade das garantias fiscais poderá ser um aspecto a rever, pois não se deve responsabilizar a administração tributária por atrasos imputáveis ao poder judicial. Igualmente o regime das informações vinculativas deverá ser revisto, tornando-se mais célere e com respostas mais acertadas. Afirmou igualmente a necessidade de adaptar o Código de Processo Tributário à maior rapidez que a informatização trouxe à administração tributária, e reduzir as constantes alterações legislativas, que se traduzem na dificuldade que os juizes têm em aplicar a lei. Também aqui, sugeriu a criação de comissões arbitrais, para minimizarem os efeitos da decisões tardias por parte dos tribunais. Em matéria tributária, sugeriu a existência de uma taxa única de IVA e uma reavaliação global dos benefícios fiscais, tendo em conta a avaliação do seu custo-benefício. Defendeu também a existência de encargos fiscais ou cargas tributárias com incidência noutros tributos e não apenas nos impostos e o aperfeiçoamento do regime das taxas que encontramos na relação com as Autarquias Locais, bem como as regras de caducidade e de prescrição. Terminou afirmando que a tendência futura deverá ser a diminuição da tributação de actividades “amigas” do ambiente, aumentando a tributação a recair sobre actividades nocivas para o ambiente. O último Orador da tarde, João Amaral Tomás, afirmou que a globalização não tem afectado, até ao momento, os países da OCDE e da UE, uma vez que se tem verificado uma redução da taxa nominal de tributação do IRC, mas tem sido acompanhada por outros elementos que compensam o efeito da redução, dos quais destacou o alargamento da base tributável e a melhoria significativa da eficiência e eficácia das administrações fiscais, proporcionada pela informação proveniente da aplicação das novas tecnologias e uma generalização da aplicação das cláusulas gerais das normas anti-abuso. Salientou que não é adequado falar de política fiscal sem falar de sistema fiscal, e destacou a sigilo fiscal como sendo um dos principais problemas da actualidade, podendo ser enquadrado em quatro vertentes: a normativa ou legislativa; a económica; a organizacional ou administrativa; e os efeitos psicossociológicos, ou seja a receptividade do contribuinte a todas estas alterações que têm vindo a ser implementadas. Referiu-se ainda às diversas experiências internacionais desenvolvidas, umas com sucesso, outras não, no que se refere à inserção da administração tributária na estrutura da administração central, nomeadamente nas diversas alternativas de inserção em variados ministérios, seja finanças, economia, etc., ou ainda à hipótese de criação de uma estrutura independente. Congratulou-se por se ter vindo a assistir a uma melhoria significativa na aplicação de medidas que visam a maior eficácia da justiça tributária, mas frisou ser este um dos aspectos mais vulneráveis da administração tributária. Ainda há muito a fazer no futuro, nomeadamente para que possamos aproximarmo-nos mais do topo do ranking internacional. Outro aspecto que mereceu referência pela sua vulnerabilidade, é a informática tributária, que está sub-dimensionada para responder a todas as prioridades, pois existe um grande número de projectos que não se conseguem implementar porque não há capacidade instalada, tendo que dar primazia a outras prioridades. Pese embora estas dificuldades, salientou a extraordinária melhoria de eficiência na utilização da informação tributária disponível, tendo possibilitado uma resposta bastante satisfatória ao nível da cobrança executiva, cujo mérito não é tanto o que tem cobrado, mas sim o cada vez menor montante que se tem deixado de cobrar, contribuindo para uma execução orçamental a decorrer dentro do expectável, dada a conjuntura internacional. |